segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Alguns casos engraçados

Bom dia, queridos...

Claro que no tempo de hospital também se agrega uma infinidade de histórias engraçadas prá contar... Um hospital não é feito só de dor, só de sofrimento, não... No meio disso, a gente se diverte um pouco, sim... Eu, pessoalmente, recebi de Deus o dom da alegria... e acabo me divertindo até onde não "deveria"...

Lá no primeiro dia, conheci também a dona Iracema... uma senhora simpatissíssima, muito conversadeira e cheia de bons casos prá contar... Dei boas risadas com ela... A todo custo ela queria me casar com alguém... Enfermeiro, médico, técnico de radiologia... Quem fosse homem e entrasse no quarto delas, ela dizia "e esse, o que você acha?"... rss... Bonitinha de tudo...

Ainda no "quarto 100", o primeiro onde a Didade ficou, onde conheci a dona Maria e a dona Iracema, tive algumas breves, mas ótimas experiências...

Lembro rindo alto de uma senhora, descendente de italianos, muito agitada e um tanto brava, que tivera um avc algum tempo atrás e, na proximidade de um aniversário onde reuniria a família, resvolveu levantar as 4 da manhã prá fazer faxina, pois, segundo ela, a nora não limpava a casa direito... resultado? Uma costela quebrada!!!

Teve uma outra que estava acompanhando a mãe... Ela e os irmãos revezavam nos cuidados com a mãe, mas ela estava furiosa, pois a mãe sempre tinha problemas com a sonda no dia dela cuidar... Ou a sonda entupia, ou saía, algo acontecia... Por que será que era sempre na vez dela? Acho que era algo relativo ao signo dela, mas nunca ao fato dela não saber lidar com a sonda... rss... Mas o "causo" que vou contar aqui é que a velhinha estava reclamando de fome, afinal, estava com a sonda entupida, sem comer há algumas horas... E então, chega a hora da janta dos pacientes e dos acompanhantes... a filha pega sua refeição, abre do lado da pobre velhinha e começa a comer... Eu não sabia se ria ou se chorava... Mas depois disso, não consegui mais comer caso a Didade estivesse acordada...

Tinha também uma cantora... era uma senhora bem velhinha também... Cantaaaava o dia todo... e a noite toda também... rss...

E então veio a dona "Chorosa"... Essa me fez perder o bom humor, a esportiva e até um pouco da educação... Ela chegou numa viatura do SAMU, trazida por uma vizinha, pois estava tendo um ataque do coração... e gritava e xingava sem parar com a vizinha pois estava de camisola e queria ter se trocado. Era engraçadíssimo no começo. Mas depois transcendeu todos os limites... essa mulher chorou durante mais de 30 hs sem parar... eu NÃO estou exagerando... chorava porque o soro tinha acabado, porque o acesso estava doendo, porque estava com falta de ar... até aí eu respirei fundo... Perdi a educação e a paciência quando ela começou a chorar porque não tinha telefone no quarto do hospital e tinha acabado a bateria do celular dela, porque não tinha janela nem televisão no quarto!!!! Tenha dó!!!! A acompanhante dela, que a essa altura já era uma filha e não mais a vizinha, estava com fones no ouvido!!!! Quase o tempo todo, eu e outras acompanhantes de pacientes e até algumas pacientes ríamos das suas constantes reclamações... Mas chegou um ponto que todos queríamos um pouco de descanso, de tranquilidade, pois ninguém estava ali em férias, não é? Felizmente a Didade foi transferida de volta para a internação em outro andar e nos livramos dela... rss...

Ainda no quarto 100, outra que nos fez dar boas risadas foi uma senhora que tinha diversas deformidades no corpo e era braaaava prá chuchu... mais do que a própria Didade foi um dia... Xingava os médicos e as enfermeiras, as vizinhas de leito e quem mais ela visse na frente... rss... Apesar da postura ofensiva dela, era engraçado e mesmo as enfermeiras riam quase o tempo todo... Arrancava o acesso o tempo todo e reclamava de fome... mas estava em jejum aguardando uma cirurgia... Acabamos rindo muito com seus xingamentos incessantes...

No 611, quarto onde passamos a maior parte do tempo na primeira internação e prá onde voltamos na segunda, tivemos algumas vizinhas engraçadíssimas...

Passei um bocado de nervoso com a primeira, na verdade com uma das filhas dela... Acordava meu pai a noite prá olhar a mãe dela enquanto ela ia fumar, mexia na cama da Didade e na Didade o tempo todo e comeu (!!!!!) meu almoço uma das vezes!!!! Era um nervoso atrás do outro, mas hoje virou tudo risada...

Outra figura foi a companheira de virose... Dona Noelia, estava sozinha, sem acompanhante e sem visita... Uma figura!!! Elétrica, volta e meia queria fugir da cama, arrancar o acesso e coisas do gênero... E era porquinha, hein... rss... Fazia cocô e colocava a mão prá cheirar (como se precisasse... o cheiro ficava impregnado no quarto todo e no corredor... rss), reclamava durante tooodo o banho - especialmente da água... rss...

Nossa última vizinha foi uma completamente fora da casinha... rss... tinha mais piolhos do que vi na minha vida inteira e dizia que eram seus bichinhos de estimação... rss... recusava tratamento que matasse "suas crianças"... Ela nunca entendeu que eu não era enfermeira... Foi ela que me fez rir durante a primeira hemorragia da Didade... o sangue saía pela sonda, que nessa hora estava funcionando como dreno, e ia para um coletor... há! Quando nossa vizinha viu aquilo, começou a espernear, perguntando o que eu estava fazendo, pq eu estava tirando o sangue da velhinha... rss... Foi meu único momento de crueldade... rss... respondi "vou beber e se a senhora não ficar boazinha, o seu vai ser o próximo"... ok, fui má... mas eu tava mega nervosa e não pensei prá responder... Depois dei boas risadas com o pessoal da enfermagem por isso...

Foi um período muito difícil, sim... mas, mais do que nunca, aprendi que precisamos conseguir rir, conseguir encontrar distração em todos os momentos, ou alguns deles jamais seriam possíveis de se atravessar...

Amanhã tem mais...

Beijos açucarados ;ó)

domingo, 2 de setembro de 2012

A primeira lição

Bom dia, queridos...

Como prometi, hoje vou contar mais um pouquinho da minha experiência nos dias passados no Hospital São Vicente...

Quando me dei conta que não teria escolha e precisaria render meu pai no hospital todos os dias até que a Didade tivesse alta, tive medo. Sempre fui muito fraca. Se via alguém vomitando, vomitava junto... ver tirar sangue, dar injeção, nem em sonho... aquela história de sonda, então, Deus, que aflição sem fim...

Pois bem... na manhã de 10 de agosto, orei, orei e orei... Pedi ajuda aos amigos queridos... pedi orações... tinha medo de não conseguir, de não dar conta, de piorar o que já estava ruim com o meu pouco jeito no ambiente hospitalar... Meu pai, pelo contrário, sempre agia como se o hospital fosse seu lugar... Ajudava a Didade (como ajudou minha avó, anos atrás) e todos os doentes dos leitos e quartos vizinhos...

Me enchi de coragem e fui... Não foi fácil vê-la quieta, ou tentando em vão falar...

Mas Deus colocou no meu caminho um anjo que facilitou meu dia e me ajudou a passar por ele... O Ramon, enfermeiro que cuidaria da Didade aquele dia... Contei a ele meus medos e preocupações, mas disse que estava ali para ajudar... e ele prometeu que me ajudaria...

Logo cedo já o ajudei a dar banho nela... como nos entendemos muito bem, me ofereci prá ajudar no banho de uma outra senhora... Dona Maria, 88 anos... Também internada com um AVC, estava sem acompanhante e sem visita desde sua internação 3 dias antes... Magrinha, cabelinho liso e bem branquinho... gemia dia e noite sem parar... Seu gemido parecia vir da alma... me disseram que ela estava inconsciente, mas eu achava que toda aquela dor era solidão...

O Ramon aceitou minha ajuda pro banho da dona Maria e então eu tive a primeira e talvez maior lição de todas... Conforme a descobríamos, encontrávamos escaras imensas e num estado muito avançado... As piores estavam escondidas sob ataduras e à medida que removíamos as ataduras, por mais cuidadosos que fossemos, pedaços da carne da dona Maria saíam... E ela gritava de dor, pobrezinha... Foi assim que vi pela primeira vez seus lindos olhos verdes...

Começamos a dar banho nela, no leito, claro, e seus gemidos aumentavam a cada pouco que a movimentávamos... Minha alma parecia doer também... Todas as vezes que eu achava que iria sucumbir num misto de piedade e solidariedade, ouvia a voz doce do Ramon me mandando ser forte...

Por outro lado, eu conversava com ela... dizia a ela que aguentasse firme, que fosse forte e corajosa e que pedisse a Deus que mandasse o consolo prá toda aquela dor... Então fui segurar a mãozinha dela prá evitar que ela mexesse no acesso* que ficava em sua jugular e ela não soltou mais minha mão... Pouco depois, eu ri e disse a ela "sei o que a senhora está pensando, li seus pensamentos... a senhora está me mandando praquele lugar pois já não deve mais aguentar ser forte, não é?"... Deus do céu... nessa hora, ela riu e beijou minha mão... Ela estava consciente!!!! Meu Deus, aquela senhorinha frágil e cheia de dor estava consciente o tempo todo... Sua família a tinha abandonado apodrecendo em vida numa cama de hospital... família conhecida aqui em Jundiaí... gente de grana...

Logo conseguiram uma vaga num leito mais confortável prá ela, em outro quarto... e sempre que dava eu ia vê-la, ficava um pouquinho com ela... E ela sorria prá mim, apesar de toda aquela dor... O Ramon também esteve perto dela (e de mim) o tempo todo. Sempre que passava por mim, me abraçava e me elogiava dizendo que eu estava me saindo muito bem... Parece que o DNA do meu pai falou mais alto...

No dia seguinte ela foi prá internação propriamente dita, daí era mais difícil ir vê-la, pois a Didade ficava nervosa quando acordava e não me via... Começava a gritar e demorava para acalmá-la...

Na madrugada de sábado prá domingo, a Didade foi pro mesmo setor e meu pai foi visitá-la várias vezes durante a noite... mas quando cheguei no domingo, Papai do Céu já tinha tido misericórdia dela e a levado prá perto dEle... Eu agradeci... foi a primeira vez que eu agradeci a Deus pela morte... e não seria a única durante esse período...

Agradeci a Deus também pelo Ramon... Ele foi essencial nesse meu "batismo" de fogo... Colocou coragem, alegria e doçura nesse dia que foi um dos maiores desafios da minha vida...

Espero que tenha conseguido transmitir a vocês essa experiência e que através da minha vivência, possam ter também aprendido alguma lição...

Beijos açucarados ;ó)

*vou acabar usando diversos termos comuns no hospital e pretendo explicá-los no final do post... neste, apenas "acesso"... quando você é internado, os enfermeiros colocam um caninho em sua veia, por onde vai entrar soro e outras medicações... é bom, pois assim não é necessário ficar furando a pessoa toda hora... mas dá uma aflição danada...

sábado, 1 de setembro de 2012

Até breve, tia querida...


Este ano meu aniversário, dia que eu tanto amo, que eu tanto espero, foi triste demais... Acordei numa tristeza sem explicação... Aliás, dias antes eu já estava triste demais... Parecia que algo me dizia que havia motivo prá tristeza...

Pouco antes do bolo surpresa que me aguardou na geladeira, a Didade teve um avc... Esse avc calaria prá sempre sua voz alegre que amanheceu cantando parabéns prá mim no dia 08, último dia que a ouviríamos...

Este avc calou sua voz e tirou sua capacidade de engolir... Mas não sua lucidez... Ela ainda mexia os braços e conseguia se comunicar conosco através de códigos que criamos...

No dia 08 ela foi internada e permaneceu no hospital até dia 18... teve alta e ficou em casa até dia 22, quando voltou pro hospital com pneumonia e infecção urinária... Lá ela ficou até dia 29, quando Papai do Céu a chamou...

A vida dela inteira foi uma lição... Nasceu na 22° semana de gestação, em 1926 e foi considerada aborto pelos médicos... Sobreviveu, porém nunca andou, pois sua coluna não estava completamente formada. Mas no dia que fiz 31 anos, teria início, através dela, a maior de todas as lições da minha vida...

No dia 10, "me internei" junto com ela, pois ficava todos os dias, o dia todo no hospital com ela e quando saí de lá no dia 29, não era mais a mesma pessoa...

Durante os dias de internação, os médicos nunca nos deram esperança de recuperação. Ela tivera diversos pequenos avc's e havia o risco de um grande... esse ou seria fatal ou a deixaria em estado vegetativo... Ele veio e encontrou um corpo debilitado, tomado por uma infecção urinária e fragilizado pelo antibiótico que tratou a pneumonia... Quem a levou não foi ele, mas todas as complicações do quadro clínico dela...

A saudade já é imensa... e hoje peço a Deus que logo transforme a dor em paz... que fique a saudade, sim, mas sem essa dor que ainda nos consome a cada segundo...

Durante toda sua vida, a Didade esbanjou alegria e vontade de viver... sofrer não é uma forma digna de homenageá-la... então, como sempre, mesmo com o coração dilacerado, me despeço de vcs deixando a promessa de compartilhar as incríveis experiências e lições que tive nos dias que passei no hospital e, beijos açucarados ;ó)